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24/11/2012

journal DII, journal FXII


os dois reflexos estavam de costas um para o outro. as pessoas foram ficando pelo caminho, deixando os dois cada vez mais a sós.

o quarto trem foi musical. vim sentada ao lado de um descendente de viking. seus traços eram suaves, tinha a delicadeza de uma pluma. a carreira de bárbaro definitivamente não lhe cabia.

o zíper da bolsinha da senhora estava quebrado: punctum. janis joplin me dava vontade de saltar do vagão em movimento e sair correndo pelos campos. campo, campo, campo, casinhas de telhado vermelho amontoadas em volta de igrejinhas pontudas e simpáticas. é isso a alemanha.

em stuttgart eu me apaixonei três vezes, uma por uma mulher. esses meus amores de verão... passam na minha frente tão rápido quanto as férias. um deles ainda olhou para trás. eles vem, roubam meu coração com sua beleza e vão embora, levando a minha história de amor junto com eles.

a inocência tem som de risada de criança. os pequenos cantam sem vergonha do mundo. onde é que nos perdemos?

os carrinhos amassados eram brinquedos velhos amontoados num canto qualquer.

o homem sem dentes lia sem atenção um livro sobre artes marciais. tinha os olhos azuis de um louco.

o quinto trem foi um avião. dor e sofrimento são duas coisas diferentes.

paris fez bater um sentimento forte de mundo. são tantas pessoas, tantas vidas, tantas histórias andando pra lá e pra cá... é quase insuportável imaginá-las acontecendo.

paris também me fez pensar sobre o tempo parado e o tempo que muda. quem é que decide? depois de dois anos longe, esperava um reencontro cheio de angústias e saudades. de silêncios e fantasmas. de dentes. mas era como se eu nunca tivesse partido, como se eu tivesse a cidade inteira dentro de mim e nada mais me fosse misterioso, por mais segredos que as ruas ainda me escondam, e eu sei que escondem. esperava inquietação, anseio, e foi tudo ao contrário, quase que sem brilho, pipoca. revirou toda a tripa do querer viver. ajna.

ce matin, j'ai appris que les amours imaginaires resteront toujours imaginaires. le silence par contre, est réel. il sera toujours là.

pensei que não se pode ter o azul, o amor e a beleza juntos. mas como escolher?

já de volta, assolada pelo sistema, esquecida das histórias, cansada e ainda inquieta, repenso minhas tripas. eu queria falar da beleza das pedras, que me rasga, e também das nuvens que me evaporam, mas eu mesma já não aguento mais tanto vidro, carne e pipoca. a cidade que me falta não existe. ela é feita de saudade, tem cheiro de chuva e cor de tempo. a cidade que me falta é como a minha história de amor.

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