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13/04/2012

journal BV, journal FXXVIII, journal, journal!

hoje uma borboleta pousou em mim. o drama durou uma vida inteira, e apenas um segundo. é engraçado como o tempo das idéias e dos sentimentos é diferente do tempo físico. é como aqueles velhinhos que andam sozinhos na rua: é uma outra vida.

é da ordem do milagre querer alguém que te quer igual, uma amiga me disse. não quis acreditar.

eu gosto mais de paris durante a noite. quando o ar é fresco e nebuloso. com todas aquelas lâmpadas sombreando a cidade. quando as pessoas são vultos negros dobrando a esquina. eu poderia ser um poeta boêmio do século xix. eu e mais dois amigos, andando torto pelas ruas, cantando odes à cidade luz, cheios de ópio, brandy e vinho correndo no lugar do sangue. nos inspirando amar e odiar.

nós seremos sempre sozinhos, um amigo me disse. chorei porque sabia que era verdade.

as mãos de balzac são quadradas e grossas. os dedos todos do mesmo tamanho com pontas arredondadas e unhas pequenas. mãos atarracadas. lembram um pouco as minhas. mas foram aquelas mãos sem charme que o fizeram balzac.

give me love and light everytime you think of me... then drop it, um filme me disse. tento praticar.

sonhei que ia pescar peixe boi, mas pareciam mais sapos do que peixes, ou bois. da rede eu tirava um cachorro pequeno e nervoso.

um dia desses fiquei trancada num quarto de hotel com um mosquito do tamanho da minha mão. quarto do pânico.

noite branca. pessoas na rua. e aquela mulher na cafeteria, colocando gelo dentro de uma garrafa, compulsivamente, com uma colher.

eu ainda me lembro do meu primeiro olhar sobre paris. é engraçado como, quando turistas, a cidade muda nos olhos. as cores, os cheiros, as ruas, tudo tem outra forma. e é isso, eu ainda me lembro com que cor, forma e cheiro paris um dia foi pra mim, mas que agora já não é mais. dois anos depois de escrever esse parágrafo não recordo nada.

em brasília, me deparo com velhos sentimentos. daqueles piores que a gente sempre tem esperança de não reencontrar, mas que no fundinho, fundinho do ser, sabe que ainda vai várias vezes. um deles é a raiva. raiva das pessoas bonitas e das feias que se passam por bonitas. que disco quebrado! que murro em ponta de faca! que saco!

há duas semanas comecei meu processo de revolução. apaguei fotos, bloqueei facebook, deletei telefones. morreu. enterrei tudo vivo. agora se vejo um fantasma, fecho os olhos. é feio, é triste, mas é a solução. me afundei no trabalho. sem tempo para pensar, nem para lembrar. o cansaço me jogava na cama, de um sono direto para o outro. depois cortei o cabelo: sai nhaca! pintei as unhas. comprei bijuterias novas. o próximo passo é uma massagem. esse parágrafo remonta 2010. dois anos se passaram e eu nunca completei meus planos. tudo novo de novo. me apaixono uma noite. sofro mil.

pensei em escrever sobre meu avô velho. 90 anos. bateu aquele medo da morte. não o fiz.

as pessoas me perguntam se estou bem. parei de responder, acho hipócrita. ninguém me chamou de chata. depois de um tempo experimentando sem sucesso, voltei a fingir ser uma pessoa normal e feliz. também não funcionou.

nesses tantos anos sem journal... foram tantos assim? no aeroporto, trocando olhares com desconhecidos, viajantes, passageiros, para lá e para cá com seus pezinhos e rodinhas. todo mundo anda, todo mundo fala, todo mundo com pressa, com importância de viver. fechei meu mundo com música. a falta da internet me reaproximou da minha memória, e cá estou acrescentando algumas palavras nela. foram tantos anos... dois. isso é muito? não falei do meu avô e meu avô se foi. quantas malas! malas maletas malinhas mochilas bolsas sacolas. parem agora de desfilar na minha frente, vocês me deixam ansiosa! não falei do meu avô e meu avô se foi, sem mais, deixou só um bilhete. coisa  mais romântica os bilhetes e as cartas... me comovem.

nesses tantos anos... meu avô. e muitas viagens. minas goiânia goiás velho. rio são paulo. brasília. nesses tantos anos... muitos amigos novos. alguns inimigos também. que maravilha! era isso que faltava: um pouco de sal, de emoção, de veneno, de crueldade. paris me ensinou a ser fria, chata, intolerante e venenosa, mas me abriu o peito de maneira que todos agora entram e saem de mim como se eu fosse um trem. descobri como dói ser trem. 2011 foi só dor. será que foi mesmo? dor é aprendizado. aprendizado é vida. quantas cicatrizes! no caso de rufus, as tatuagens são internas, um cartunista me disse. me reconheci. descobri que transformo dor em poesia. mas não é a mesma coisa? e o amor? ah o amor... o amor não usa corrente de ouro, nem óculos de lentes cor de besouro. o amor não tem barriga. o amor é corvo assassino, é gato preto, é melancholia. o amor não tem voz de taquara rachada. o amor, ah o amor... a... m... m... m... o... o... orrrrr... que palavra mais lábio... mais beijo!

cintos, botões, rendas, celulares, cadarços, mais botões, gravatas, bolsas, zíperes e canetas. é isso o aeroporto: lugar nenhum de ninguém, com cadeiras, lenços, bebês e relógios. o beijo durou uma vida inteira, e apenas quatro anos. o amor ainda acontece sem acontecer. meu terapeuta me ensinou a diferença entre dor e sofrimento: dor é momento, coisa rápida e física, sofrimento é dentro, coisa criada, dura o tempo que você quiser. o journal acontece todo dia, todo minuto na minha cabeça sem parar. aqui no aeroporto, a minha vida está batendo na porta, querendo acontecer. quem sabe em algumas horas...

retiro meu fone de ouvido: que silêncio! uma bailarina está sentada atrás de mim. linda. tem o nariz adunco e os olhos azuis, cabelo curto, liso e preto, amarrado num rabicó. é magra e parece lacrimejar. fala um inglês carregado no telefone. começa uma de minhas músicas preferidas. foi bom enquanto durou, bailarina, foi um prazer. o vovô na cadeira de rodas espera ser removido de um lugar inconveniente. meu vovô. meus vovôs. um aqui e um lá.

se essa vida de agora, que já não é real, e é, fosse um filme, eu deixaria o computador na cadeira e sairia dançando pelos corredores de embarque, saltaria as malas e desviaria das pessoas apressadas dando risada da delícia que é mover o corpo. um videoclipe já bastaria. pina, sua linda! quero escrever sobre minha vida, e minha vida não é uma monografia. poesia e só poesia! alguém, por favor? chega dessas outras chatices todas. tiro uma craca da pele. a música acaba. o avião pousa. quero só alimentar a alma, o bolso e a barriga. quero cheiro e toque. quero cor e luz. quero vento e sabedoria. amém.

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